O puxa-saco que deu de presente um chapéu e uma cabeça aos seus patrões


Puxa-saco, todo mundo sabe, tem em qualquer lugar.

Em redação de jornal, então, nem se fala.

Ouvi, certa vez, uma história sobre um certo tipo que trabalhava no Estadão: na minha época ele era chefe de reportagem de não lembro de qual editoria.

Pois bem, o que contam é que assim que voltou de umas férias o sujeito deu de cara com o dr. Júlio, como era chamado o Júlio Mesquita Neto, o homem que mandava no pedaço naquela época.

Nem acabou de cumprimentá-lo e mandou bala:

- Que bom encontrar o sr., doutor. Estava de férias, fiz umas viagens pelo interior e, sabe, achei aquele chapéu que o senhor gosta de usar na sua fazenda. Comprei e trago amanhã para o senhor. 

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Algum tempo mais tarde houve uma troca de comando na redação. Assumiu um dos inúmeros salvadores da pátria que passaram por lá, o homem que iria "profissionalizar" o jornal, isolando a opinião da notícia, entre outras promessas não cumpridas.

Uma das primeiras providências desse novo diretor de redação, que trouxe consigo uma enorme turma de aspones, foi dar uma limpa no pessoal que, a seu juízo, estava muito acostumado com a modorra que era a marca registrada do jornalão.

O nosso personagem do chapéu foi um dos primeiros a ser bicado pelo passaralho, essa ave exterminadora de empregos.

Voltou para a sua terra natal, no interior do Estado. 

Disseram que teve até de passar por tratamento psiquiátrico, tal a intensidade da depressão pós-demissão de que foi acometido.

Até que arrumou novo emprego, de assessor de imprensa dos ricos e poderosos produtores de açúcar e cana da região.

E assim, teve a chance de voltar ao velho e bom puxa-saquismo: foi ele quem pediu a cabeça, à diretoria do Estadão, do correspondente do jornal naqueles lados, já que o rapaz vinha fazendo matérias que não agradavam aos nossos patrióticos "produtores rurais".

Em outras palavras, evoluiu: em vez de dar um chapéu, deu uma cabeça inteira aos seus novos patrões. (Carlos Motta)

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